Vendem-se viaturas “a preço de banana” nas avenidas da capital do país

14:04

 Há carros à venda nos passeios da cidade de Maputo, uma actividade que contraria a postura municipal. Além de ir contra as normas da edilidade, o negócio é uma concorrência desleal, uma vez que as viaturas são vendidas a um preço muito abaixo do aplicado nos parques licenciados para o efeito.



As autoridades municipais têm dificuldades para identificar os respectivos vendedores, mas o edil da capital determinou, sem revelar a estratégia, que a prática deve acabar.


É muito comum ver, nas avenidas da cidade de Maputo, carros estacionados, até de forma desordenada. São viaturas que, de longe e vistos com um olhar distraído, parecem de quem vive ou trabalha aos arredores.


Num dos carros está escrito “vende-se”, contudo há mais de uma viatura à venda na avenida Karl Marx, na cidade de Maputo. Para ter acesso às informações sobre os veículos à venda, basta o cliente ligar para o contacto à vista de todos e pedir os detalhes, tal como a transcrição que se segue de uma simulação que “O País” fez.


“Estou a ver um Ractis, aqui, cinza na Karl Marx. Yah. Ainda é novo esse carro, embora tenha esse “encostuzinho”, mas o meu pintor pode resolver isso. O carro é novo ainda, não tem nenhum problema. Ainda é recém-chegado, acho que estás a ver a matrícula aí. Então, eu estou a fazer 250 paus. Estou a dar mesmo. Ractis subiu muito”, argumentou, tentando persuadir, o vendedor de viaturas nos passeios da capital.


O Toyota Ractis à venda era um cinza escuro. Havia, entretanto, mais um preto além das várias outras opções que são apresentadas a quem queira comprar, mas tudo num forte sigilo. “Tem aí um BMW, mas tenho, também, uma carrinha. Os carros que eu tenho são grandes. – Eu queria, no máximo, até 350 ou 400 paus, posso pagar (repórter) –Por que não levas esse BM branco bonito? BM branco. Estou a dar a 330 pah!”, indicou mais uma das opções ao cliente.


Ao cliente são dadas todas as informações relevantes sobre a viatura, mas com técnicas de marketing à mistura para garantir a venda do carro. “Essa BM está top ainda, motor impecável, ar condicionado e música. A única coisa que tem… os calços estão a chiar um pouco, acho que é por causa da chuva ou por não estar a usar. Eu estava a fazer 380, baixei agora para 330”, descreveu o vendedor, determinando o preço.


Se alguns vendem os carros nos passeios da Cidade das Acácias de forma mais discreta possível, os outros, simplesmente, nos expõem para quem queira ver e comprar.


Os preços e os argumentos dos vendedores são atraentes e são eles mesmos que dão um suporte no tratamento da documentação da viatura.


Vendidos e comprados nos passeios, o vendedor reconhece que ao município de Maputo não se paga taxa por este negócio.


“Pagas tu para trocarmos os nomes. São 2.450, mas se queres hoje para sair hoje, em teu nome, sair agora, sabes como é nem. Tens que orientar mil paus a parte para eles darem um assinante lá dentro, o chefe nem. Aí tens na mesma hora. Ficas uns trinta minutos, tens o livrete em seu nome. Temos que trocar no fonte azul. Lá no registo de automóveis”, explicou o vendedor de viaturas, numa chamada efectuada pela nossa reportagem.


Os carros vendidos nas avenidas da cidade de Maputo chegam a estar mais baratos que nos parques licenciados para a venda, sobretudo, com a pandemia da COVID-19 que encarece a importação de viaturas.


Um Toyota Ractis vendido a 250 ou 230 mil meticais nos passeios, nos parques pode até custar 300 mil, preços proibitivos para os clientes e concorrência desleal para os revendedores autorizados.


“O valor que nós cobramos por uma viatura, no parque, eles, lá fora, podem cobrar 30% menos do que nós pedimos. Por isso, os clientes acabam comprando lá na rua do que cá dentro (no parque)”, apontou Celso Simango, gerente de um dos parques de venda de viaturas na capital moçambicana.


Dercília Chissano, também gerente de um parque, dá evidências: “Um Ractis no parque custa 350 mil e antes andava nos 270 ou 265, mas de um tempo para cá já anda 350 mil. Na rua, você ainda pode apanhar a 260 mil meticais”.


Os parques importam viaturas e aplicam preços, tendo em conta, não só o lucro, mas também o pagamento do espaço onde exercem a sua actividade e dos trabalhadores, facto que não acontece com os que vendem nas ruas.


“Eles importam individualmente e de Durban, que é perto, os carros saem mais barato. Então, para nós que ainda temos que pagar as instalações, luz e trabalhadores fica complicado”, queixou-se


A Autoridade Tributária de Moçambique explica que, para a importação de viaturas destinadas para a venda, o importador deve ter um cartão que lhe dá autorização para o efeito.


“Deve estar licenciado no Ministério da Indústria e Comércio com cartão de importador e possuir os documentos que vão permitir o desembaraço da mercadoria”, enumerou Algy Ali, da Autoridade Tributária de Moçambique.


Os vendedores das viaturas à venda nos passeios da cidade de Maputo pagam os direitos aduaneiros e a prova disso é a matrícula que ostentam. Contudo, caso as viaturas tenham a chapa de inscrição e não conste do sistema da Autoridade Tributária é dada como roubada.


A Polícia Municipal de Maputo reconhece que o facto existe e é reprovável à luz da Postura de Trânsito, mas tem dificuldades para encontrar os vendedores de carros nos passeios.


“De certa forma, isto constitui uma concorrência desleal com os que estão autorizados a exercer este tipo de actividade. É proibido o estacionamento de viaturas para venda nos passeios da Cidade de Maputo”, sublinhou Mateus Cuna, porta-voz da Polícia Municipal de Maputo.


Os que fazem este negócio não dão as caras, mas o Conselho Municipal fala de uma sensibilização para o abandono desta actividade que considera ilegal. E, por isso, “é preciso chamarmos atenção que vamos avançar para as fases das actuações”.


O presidente do Município de Maputo disse que o fenómeno ainda não mereceu uma discussão a nível da edilidade, mas determinou que tem de acabar.


Além dos passeios da cidade de Maputo, as viaturas têm sido vendidas nas redes sociais, mas sem se pagar qualquer tipo de imposto.

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