Com a fronteira de Ressano Garcia encerrada para entrar na África do Sul, vários moçambicanos recorrem à via clandestina de Macuácua, na vila de Namaacha, província de Maputo.
Não é novidade para ninguém, mas nem por isso tornou-se legal. Macuácua é um corredor de moçambicanos que querem atravessar para a vizinha África do Sul ilegalmente. Com as fronteiras encerradas, agora até os que têm passaportes recorrem àquela via.
Ontem, “O País” esteve no Terminal Rodoviário da Junta, onde um dos transportadores contou que há travessia todos os dias. “Para ver qual deles é ou não viajante, só tens de ver as pastas que trazem nas costas. Eles viajam por via dos arames de vedação que separam Moçambique da África do Sul”.
Mas antes de chegar ao arame, tudo começa no Terminal Rodoviário da Junta. O percurso é feito com os envolvidos tendo clareza sobre a função de cada um deles. Os transportadores da Junta devem levar os passageiros até perto da fronteira de Namaacha. “Eu quando levo os passageiros deixo-lhes na fronteira para serem levados pelos carros caixas abertas”.
E de lá em diante, ficam entregues aos agentes da Polícia de Fronteira, como nos contam os transportadores. Além de preparar 200 rands, para pagar aos supostos agentes, os passageiros não precisam de saber de nada.
Prova disso foi um jovem que encontrámos já aconchegado no transporte semi-colectivo e a comer um pão com pastel de feijão (badjia). Ele afirmou categoricamente não saber o que vai acontecer lá mais adiante, mas que ia “ver lá à frente”.
Diferente dele, estava o seu companheiro de viagem que, embora não tendo detalhes, sabia bem que a via que teria de usar era “a ilegalidade”. Ele diz que tudo que quer é sair do país e voltar ao seu posto de trabalho no país vizinho, porque está “cansado da fome aqui em Moçambique”.
Samuel Mandlaze, outro viajante ilegal, natural de Gaza, também está farto da fome e do desemprego que diz haver em Moçambique, por isso nele mora agora uma certeza: “Não volto, eu não volto! Aconteça o que acontecer!”. E Mandlaze não fez a escolha de ir via ilegal por falta de documentos. “Tenho passaporte e tudo, mas a fronteira está encerrada e só entram sul-africanos”.
Quem também tem todos os documentos, incluindo o teste da Covid-19, é o cidadão moçambicano com quem falámos ao celular depois de chegar a Joaneburgo. Ele conta que o esquema começa mesmo quando o semi-colectivo parte da junta. “Aos sair de Maputo, há um carro que vem por trás. Quando estiver perto de Namaacha, o carro que vem por trás, vem procurar pessoas que vão a Macuácua. Perguntamos quanto devíamos pagar, disseram que eram 100 meticais”.
Os 100 meticais são pagos pelo transporte, mas mais adiante há mais dinheiro por se pagar e isso não garante uma total segurança já em Macuácua. O facto é que o processo é tratado como se fosse legal. “Ao descer, num sítio limpo, perto da Estrada, lá estão os soldados. Ao chegar neles, eles dizem não querer nada senão que paguemos 200 rands. Depois de entregares os 200 rands, mandam-te ir. Perguntámos para onde, disseram para ir e que veríamos os nossos companheiros mais adiante. Estava muito cheio”.
Este moçambicano fez a viagem na última terça-feira, um dia depois de a África do Sul ter encerrado as fronteiras com Moçambique. Ele conta que nem tudo é um mar de rosas. A vigilância sul-africana aumentou e naquele dia, chegou um helicóptero para prender os ilegais. Valeu a intervenção dos residentes de Namaacha. “As pessoas de Namaacha, quando nos vêem, avisam-nos caso esteja a Polícia por perto e pedem que entremos nas suas casas para seguirmos a viagem no fim do dia”.
“O País” sabe que quase todos os dias os sul-africanos enviam um helicóptero para fazer vigilância no local. Nessas situações, os residentes de Namaacha fazem das suas casas os centros de alojamento até que a vigilância abandone o local.
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